Artigo nº 011 - crônica social
O Metrô: o buraco em que nos enfiamos - 5ª parte
E pra terminar - pelo menos por ora, essa viagem pelo buraco-negro em que se transformou o metrô - foi muito emocionante ver a lei que instituiu o carro rosa das mulheres, mas ainda mais vibrante foi vê-la entrar em linha, em vigor. E que vigor!
Seria realmente uma "gracinha" se não tivesse sido imposta com exagerada força policial. 'Vi, com esses olhos, que a terra a de comer', guardas e usuários rolarem no chão em luta livre. Num dos casos, um usuário apenas resolveu defender um casal que tinha adentrado o vagão proibido. O esposo estava sendo puxado pelos guardas, enquanto sua esposa ficava no vagão, ao mesmo tempo em que o aviso sonoro avisava sobre o fechamento das portas. O pau comeu na estação e a polícia metroviária cercou um a um os que protestavam em que pese às vaias quase unânimes de homens e mulheres que assistiam a episódica cena.
É claro que não faltou quem defendesse a vantagem obtida.
A nova lei seria realmente uma "beldade" se também não significasse interesses espúrios, o que tem se tornado um triste hábito em nosso país: os interesses do consórcio monopolista que arrematou o “direito” (e os capitalistas estão cheios deles) de explorar a concessão metroviária e suas artérias e veias sempre repletas de sangue fresco. Tal direito foi-dado a uma horda de banqueiros sedentos de muito lucro e sangue.
A fim de transformar usuários do metrô em “sardinhas em lata” nada melhor que preparar um carro especial para as “sardinhas fêmeas”: e o vagão das mulheres vai se transformando no vagão mais desconfortável de se viajar. E, o que parecia respeitar as mulheres (respeito é bom e elas merecem!), pode estar sim, submetendo-as justamente ao oposto do que se propunha.
No metrô não vale aquela lógica do 'viva à diferença!' que se ouve tanto falar na educação, onde a escola precisa acolher e manter unidos todos os tipos de alunos na mesma sala de aula: aqueles com deficiências auditivas, visuais, mentais com a maioria. Talvez a justificativa na educação seja a mesma utilizada pelo metrô: maximizar os lucros (só que na educação, ainda pública, isto se daria diminuindo os gastos públicos para em seguida repassá-los ao setor privado).
Mas, como dizia, 'respeito é bom!' O mesmo vale para os bancos de cor laranja do próprio metrô. É fácil assistir adultos e jovens saudáveis sentados indiferentes em seus bancos verdes enquanto idosos ou até gestantes viajam em pé, pois os bancos laranjas já estão lotados de idosos, gestantes e 'portadores de deficiência'. Mas, 'o banco verde é nosso', tendem a pensar especialmente as pessoas não-especiais. É uma espécie de racismo que começa pela discriminação de cor (do assento, "calma aí!") e termina no egoísmo e na falta de educação, mesmo.
O curioso é que leis como essas apenas aparentam preocupação com a pessoa humana, quando na verdade apenas estão a abrir o caminho para o pior. É que os planejadores (do lucro) do metrô há muito e paulatinamente preparavam o campo para entupir de gente os parcos vagões do metrô. Amantes sádicos do desconforto alheio, não deixam de expressar muito claramente esta concepção em cartazes afixados no interior de cada vagão, onde vê-se estampadas propagandas da empresa metroviária que passo a descrever: trata-se da imagem de um brinquedo de montar (quebra-cabeça) e a recomendação para que cada um 'faça a sua parte', pois assim, 'tudo se encaixa'. Aí então vejo-me na obrigação de fazer aquela pergunta que não podia deixar de ser maliciosa: Se isso não é ideologia coisificante, o que seria?
Afinal de contas: que mundo é este que uma meia-dúzia está recriando para todos nós? Até quando permitiremos leis que desrespeitam a todos, ao separá-los em maioria e minoria(s) para contrapô-los? A continuar toda essa mesquinhez, depois do carro rosa, há que ser criado outros de diferentes cores: para gays femininos, para gays masculinos, para negros, brancos...
E aí teremos alcançado a mais nova edição do apartheid, só que à moda dos campos de concentração hitleristas com seus galpões onde o ser humano, a exemplo do que é feito com o gado, é metafisicamente classificado por 'raça' (biológica ou culturalmente falando): por 'cor', sexo, preferência sexual, nacionalidade ou por qualquer outra forma de tribalismo.
Nazismo? De novo? Fiquem atentos!
Renato Fialho Jr. (JAN/2010)