Artigo nº 006 - jornalístico
O capitalvírus e a superioridade moral e ética do modo de produção socialista
24/03/2020 (atualizado em 25/03/2020) -
Segundo se percebe ao consultar o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa’, de Antônio Geraldo da Cunha, o radical ‘cris’, assim como os radicais ‘cru’ e ‘cruz’ parecem ter origens bem similares. Se o radical ‘cru’ é um adjetivo que indica algo ‘cruel, feroz’, ‘cruz’ é um substantivo para o ‘antigo instrumento de suplício’ usado pelos romanos em execuções de pena de morte. Dos dois radicais advém a palavra ‘cruento’, que significa ‘sanguinolento, sangrento, cruel’ e a palavra ‘crucial’, que quer dizer ‘decisivo’. Ainda segundo o mesmo dicionário, no português medieval (século 14), se usava ‘cruçiaes’ para designar ponto extremo, ponto importante, ‘em alusão às quatro extremidades da cruz’. Já o radical ‘cris’, em malaio ou javanês, significa ‘punhal’ e dela decorre a palavra ‘crisada’ ou ‘golpe de cris, punhalada’. Mas tanto em grego (krisis), quanto em latim (crisis), que dão origem a palavra aportuguesada ‘crise’, o significado é de ‘alteração, desequilíbrio repentino’, ‘estado de dúvida e incerteza’ ou ainda ‘tensão, conflito’. Daí deriva a palavra crítica, ‘apreciação, julgamento’ e, por extensão, aquilo que é ‘grave, perigoso’. Já a palavra ‘cristo’, como é sabido, significa aquele que foi sacrificado na cruz.
Pois bem, vivemos um tempo de crise! O modo de produção capitalista está, além de velho e rabugento, moribundo e indiferente à própria (ideia de) vida. Com seu egoísmo inato, parece cada vez mais indiferente à raça humana que sempre usou, explorou, coisificou e dilapidou! Mas, antes de maneira gradual e agora repentinamente, parece obrigado a se convencer de seu final inevitável e inexorável - ou seja: aquilo que acontecerá de modo ‘implacável, austero, rígido’.
A crise de 2008-2009 (que se expressou na virulenta queda das bolsas de valores) abalou profundamente o que antes era um mundo unipolar e extremamente orgulhoso de si mesmo. A crise de 2008-2009 abriu os olhos de diversos países para o perigo da unipolaridade, hegemonizada pelos Estados Unidos, que tinha como 'lastro' seu arsenal militar e sua moeda, o dólar. Daí em diante diversos países começaram a se mexer na busca de construir uma alternativa para a crise aprofundada naqueles anos e que vinha coligada com o receituário neoliberal. E a alternativa encontrada por alguns países foi a multipolaridade, capitaneada pelo surgimento do BRICS (hoje bRICS com ‘b’ minúsculo) que, com Bolsonaro, pode virar RICS.
O capital, que desde a década de 1970-80 vinha trocando a materialidade das fábricas pelo idealismo da especulação financeira, como receitado pela escola econômica neoliberal austríaca, fez crescer nesse processo imensas bolhas especulativas (ou expectativas de lucros não realizadas e que costumam deixar ao ‘deus dará’, no final das contas, seus mais fiéis e devotados acionistas).
Tal imponência e arrogância burguesa havia crescido absurdamente após a derrocada do socialismo na URSS e no Leste Europeu! Em que pese as virtudes imanentes a esse modelo de vida social, política e econômica (fim do desemprego e resolução de grandes problemas sociais devido a um orçamento fortemente voltado para educação, saúde, transportes, cultura, previdência, esporte e lazer, sem falar na grande infraestrutura econômica criada e gestada pelo Estado Socialista e que serviu de base a todo esse desenvolvimento), foi seriamente impactado, aliás desde o início quando da Revolução de Outubro de 1917, por uma burguesia que para se manter no poder e auferir maiores lucros se tornou mais e mais agressiva, armamentista, colonialista, racista, machista, xenófoba, preconceituosa e midiaticamente manipuladora. O apogeu de todo esse movimento e esforço contrarrevolucionário levado adiante pelos grandes trustes monopolistas foi o nazifascismo, que por muito pouco não subjugou o mundo, exterminando enormes parcelas da população humana nos campos de concentração.
Para sobreviver ao endurecimento que lhe foi imposto desde sempre, o socialismo teve que se constituir em meio a constante pressão e opressão do sistema capitalista (majoritário no mundo), que nunca deu trégua ao conjunto de trabalhadores e proletários organizados dentro e fora do modo de produção capitalista. A fim de responder a tudo isso, o novato modo de produção se viu na condição de estabelecer e desenvolver um inevitável processo de burocratização: só um Estado forte e organizado militar e burocraticamente poderia fazer frente à besta-fera que a burguesia havia criado - o capitalismo fascista!
Todo esse fabuloso e gigantesco empenho se expressou na vitoriosa e gloriosa Grande Guerra Pátria Soviética, que culminou com a derrocada do regime nazista de Adolfo Hitler. Mas, não seria errôneo afirmar que a vitória da URSS foi, pelo menos em grande parte, uma vitória pírrica (ou vitória de Pirro - expressão utilizada para se referir a uma vitória obtida a alto preço, acarretando prejuízos irreparáveis).
Em consequência disso, a URSS, após a morte precoce de Stalin, passou a ser conduzida por Kruchov, seu polêmico sucessor, que além de denunciar o que ficou conhecido como ‘os crimes de Stalin’ (até a dita denúncia, Stalin era muito bem visto em todo o mundo em virtude de seu inquestionável protagonismo na luta antifascista!), apontou para a ideia da coexistência pacífica, que garantiu o estabelecimento de uma nova forma de opressão ao socialismo: a guerra fria (iminência de uma guerra nuclear que de fato era uma guerra irrealizável). No governo de Kruchov, o modelo socialista, com a corrida armamentista, vai acelerar ainda mais o processo burocrático e militar, desviando importantes recursos da área social para isso e gestando uma separação cada vez maior entre a base da sociedade socialista (os sovietes) e a cúpula do partido (o PCUS).
O desfecho desse processo é do conhecimento de todos os historiadores e de boa parte dos que viveram essa época: a queda da URSS em agosto de 1991.
Mas agora, passados quase 30 anos desse feito burguês, o capitalismo está novamente de cara com uma nova crise cíclica, que já vinha se apresentando desde o ano passado (2019) e que aconteceria de uma forma ou de outra no decorrer desse ano de 2020.
Contudo, a pandemia do coronavírus (covid-19) veio acelerar e dar um caráter ainda mais dramático à crise que já se instalou. A privatização de grande parte das empresas e dos serviços que estavam sob a responsabilidade dos Estados nacionais de todo o mundo levou à impossibilidade por parte da maioria absoluta da população proletária, cada dia mais empobrecida (cerca de 6 bilhões de pessoas), de ter acesso aos direitos econômicos, sociais, individuais e políticos tão necessários para o bem-viver (os direitos humanos e constitucionais básicos).
O consumo capitalista dos bens sociais das democracias populares do Leste Europeu e do Socialismo soviético somado ao consumo, sucateamento e destruição do Estado do Bem-Estar Social keynesiano, de tipo liberal capitalista, levou aos estertores a própria política neoliberal capitalista, depois de três décadas de insistente monetarismo (a ideia de que o mercado seria uma espécie de deus que a tudo cria e regula). O amor pelo dinheiro só fez desumanizar e arrefecer o nicho de civilização até então acumulada, o pós-modernismo colocou em dúvida a verdade e a ciência, abrindo espaço para o fundamentalismo religioso e intransigente e às guerras imperialistas (como a que foi levada pelos Estados Unidos, via Estado Islâmico e Al Caeda, na Síria). A competição acirrada levou à monopolização sem precedentes da economia e gerou o absurdo de termos hoje a mais alta centralização e concentração de capitais da história do capitalismo, onde 8 bilionários possuem igual riqueza que 3.600.000.000 de pessoas (metade da população mundial).
Assim não é difícil verificar por que se propaga tão facilmente o novo coronavírus nesses meses de fevereiro, março e abril de 2020. Sem sistemas de saúde pública ou com eles praticamente alquebrados e sucateados pela política neoliberal tão recomendada pelo FMI, Banco Mundial e demais organismos multilaterais e governos asseclas e orgulhosamente antipopulares, o covid-19 tem uma estrada aberta para se propagar. Só para se ter a dimensão atual da pandemia que se alastra pelo planeta, selecionei o quadro de 23/03/20 da OMS que aponta para 334.981 casos confirmados e 14.652 mortos, com o vírus chegando à quase totalidade dos países existentes no mundo: 190 países já foram afetados (vide o gráfico 1). Mas no mapa desenvolvido pela Universidade John Hopkins, Estados Unidos, os números surgem mais atualizados: 381.499 casos, com 16.572 mortos e 101.794 pacientes recuperados (Gráfico 2 - acesso às 01:30 hora de Brasília - 24/03/2020).
Gráfico 1:
Gráfico 2:
FONTE EM TEMPO REAL:
https://gisanddata.maps.arcgis.com/apps/opsdashboard/index.html#/bda7594740fd40299423467b48e9ecf6
Mas como é fácil verificar: os países que estão encontrando menos dificuldade ou se mostrando mais solidários no combate a pandemia global do coronavírus são exatamente os países ditos socialistas (China, Cuba, Coreia do Norte, Vietnã) ou aqueles que lutam e relutam contra a lógica predatória e desumana imposta pelo deus mercado, através da multipolaridade (Rússia, Venezuela, Nicarágua) e que a mídia burguesa, que monopoliza também os discursos que circulam mundo afora, não cansam de chamar de ‘eixo do mal’, numa lógica absurda onde Mercado (=deus) e priorizar o ser humano (=diabo).
As notícias a seguir confirmam essa afirmação:
08/02/2020 - CIBERCUBA
China usa medicamento Cubano para enfrentar o coronavirus
16/03/2020 - CUBADEBATE
Cuba autorizou que o cruzeiro britânico MS Braemar (com 5 casos de covid-19 confirmados) atraque no país por razões humanitárias
17/03/2020 - RT
China permite os primeiros testes clínicos de uma vacina contra o coronavírus
17/03/2020 - RT
China evitou 95% dos casos de coronavírus por ter imposto a quarentena 3 semanas antes
17/03/2020 - RT
China: Quase 3.700 médicos regressam a seus lares após ficar sob controle a epidemia do coronavírus
21/03/2020 - RT
Rússia envia a 13 países testes para detectar o coronavírus
21/03/2020 - RT
Rússia enviará a Itália virólogos militares e equipamentos para ajudar a freiar a pandemia do coronavírus
22/03/2020 - CUBADEBATE
Chegam médicos cubanos à Lombardia (Itália) para apoiar a atenção sanitária frente ao COVID 19 (+ Vídeos)
23/03/2020 - Revista Fórum
Venezuela pagará salários de trabalhadores públicos e privados por 6 meses, para que fiquem em casa
O covid-19 está a paralisar os mercados e os serviços de todo o mundo: escolas, indústrias, comércios, hotéis, transportes, praças e ruas, estádios esportivos, torneios, campeonatos e até a Olimpíada 2020. E não por acaso as bolsas de valores acumulam perdas gigantescas, formando ou ampliando as bolhas especulativas, que não param de estourar (vide as quedas dos índices). Só a bolsa de valores de São Paulo, viu o seu índice, o Ibovespa, recuar de quase 120.000 pontos no início de janeiro para 63.569 no fechamento de 23/03/20, com perdas acumuladas de 47%, voltando ao seu menor nível de fechamento desde 10/07/17 (vide o gráfico 3). Duas notícias mostram o panorama de nuvens negras que ameaçam e açoitam o mercado bursátil brasileiro:
12/03/2020 - Brasil 247
Ibovespa cai 15% e Bolsa aciona o quarto circuit breaker na semana
16/03/2020 - Brasil 247
Bolsa abre e fecha em menos de 30 minutos, com primeiro circuit breaker e queda de 12%
Gráfico 3:
Fonte: https://br.advfn.com/ - acesso em 23/03/20
Quanto à bolsa de valores de Nova York, a maior do planeta, caiu de 29.600 pontos em 20/02 para 18.591 pontos, acumulando perdas da ordem de 37,2% (vide gráfico 4). As perdas trilionárias tendem a crescer e a ‘solucionática’ neoliberal segue sendo a lógica predominante de abordar os buracos deixados pelo mercado: salvando os ricos e deixando os trabalhadores à mercê do vírus e aprisionados em suas próprias casas (quase sempre pequenas e lotadas de gente). Mas, o Banco Central Europeu assim como Trump já deram o tom:
25/03/2020 - RT
A Casa Branca e os senadores acordam um pacote de estímulo de 2 trilhões de dólares para aliviar o impacto do coronavírus
23/03/2020 - RT
Reserva Federal (FED) dos Estados Unidos anuncia medidas sem precedentes para superar 'os graves trastornos' econômicos causados pela pandemia de covid-19
18/03/2020 - RT
O BCE lança um plano de compra de bônus por 'emergência pandêmica' de 750 bilhões de euros
Gráfico 4:
Notícias como a que se seguem são a melhor expressão da imoralidade e da anti-ética (ou ética desumana) do capitalismo:
24/03/2020 - Revista Fórum
Vice-governador do Texas diz que avós deveriam se sacrificar para salvar a economia para os netos
23/03/2020 - Brasil 247
Dono do Madero, Junior Durski, diz que não se pode parar a economia por conta de 5 ou 7 mil pessoas que vão morrer
22/03/2020 - Brasil 247
Luciano Hang, dono da Havan, ameaça demitir 22 mil trabalhadores
Infelizmente, como podemos ver acima, a gentalha empresarial que apoiou e financiou a campanha de Bolsonaro à presidência, como Luciano Hang (Havan) e Junior Durski (Madero), são os principais conselheiros que tentam interferir na crise brasileira, mas não com o pretexto de aliviar as dificuldades sociais da imensa maioria, mas sim de favorecer e preservar os grandes capitalistas e financistas. Mas talvez o que esses apoiadores não estejam percebendo, é que os principais favorecidos serão as empresas transnacionais, cujas sedes se encontram nos Estados Unidos.
Aos trabalhadores, resta a resistência e a luta não só pela existência, mas por um mundo melhor!
Que saibamos anular o vírus da ignorância e o vírus do conservadorismo que teimam em conservar o vírus mais letal que está a destruir a natureza e a humanidade: o capitalvírus! E que aprendamos a perceber a superioridade ética e moral do modo de produção socialista, que a burguesia e sua mídia tanto difama e busca eliminar do imaginário utópico dos trabalhadores de todo o mundo! E que as crisálidas (radical 'cris' como crise), após aguardarem o ciclo crítico de um longo e penoso inverno, possam, enfim, sair de seu confinamento para então, já em ar primaveril, alçarem-se no mais belo e coletivo voo!
Renato Fialho Jr.