Artigo nº 006 - chamamento à participação cidadã

Uma análise (sobre a ausência de análise) de conjuntura


02/06/16 - Como é difícil realizar na atualidade aquela máxima do ‘velho barbudo’: ‘Trabalhadores de todos os países uni-vos!’ Eu diria até: ‘Como é difícil realizá-la no Brasil em que pese a conjuntura golpista que se desenvolve a olhos vistos e de uma maneira avassaladora para a classe trabalhadora e seus filhos e filhas. Em momentos assim, por ser imperativo, é relativamente fácil se unir! O golpe brando e branco, que agora tentam lavar com o sabão em pó que lave mais branco, está 95% consumado pela mais suja e abjeta burguesia apátrida e fascista. Mas, em muitos lugares, estamos a discutir ‘abobrinhas’ e pormenores, como se o golpe fosse apenas contra o PT: um Fla x Flu, como gosta de dizer a mídia. Se o PT fosse um partido neoliberal linha dura, um golpe seria desnecessário! Isso deveria parecer óbvio! Outra questão é: Não se consegue perceber que o golpe é também e sobretudo contra o povo mais pobre, contra as políticas sociais e contra a democracia em geral (e não só contra a democracia burguesa)? É difícil perceber que o golpe busca impedir a unidade da América Latina e os BRICS que se está a construir?

Mas, voltemos à questão da unidade. A dificuldade de união dos setores populares num momento de facilidade inédita para fazê-la, não para de machucar as consciências em nossas assembleias do SEPE.

A nossa dificuldade de união vem de longe. Onde podemos unir desunimos. E onde devemos estar livres, desunidos, exige-se um consenso, uma união. Por exemplo, há anos que foi retirado das pautas de nossas assembleias o ponto sobre ‘análise de conjuntura’. Perde-se um tempo irracional com filas de credenciamento, inscrições de nomes para ‘avaliação do movimento e propostas de ação’, leitura de cento e tantos nomes inscritos, sorteio dos inscritos (geralmente 10 companheiros) e leitura dos nomes sorteados! Se perde aí pelo menos uma hora por encontro! Isso é um absurdo! E dizem que não podemos abrir tempo para cinco análises de conjuntura de 5 minutos cada.

Já que a loteria é o método preferencial, uma solução para evitar a burocracia atual seria, no credenciamento, reservar na ficha de credenciamento um espaço para marcação de ‘x’ para quem desejar falar na assembleia. Se o ‘x’ for marcado o ‘ticket contendo número - nome – regional’ é imediatamente destacado e posto em uma urna para sorteio. Ganharíamos muito tempo com isso, viabilizando um precioso tempo para análises de conjuntura.

Mas, infelizmente, esta ausência de análise parece advir do predomínio de um certo liberalismo egoísta de grupo. Uma espécie de vontade de poder nietzschiana (ou seja: uma vontade intransigente de dividir). Estes grupos travam batalhas inférteis e às vezes bem barulhentas. Tem até uma parte (logo não deixa de ser um partido) que chega mesmo a falar em ‘sindicato sem partido’, como se isso fosse possível. Medo de quê? De aparelhamento esquerdista? Será que agora só é permitido o aparelhamento se for direitista? Mas, sobre a questão da conjuntura, viceja uma espécie de consenso autoproibitivo. Como se estas ‘análises’ fossem desnecessárias ou pelo menos desnecessárias para as grandes massas (porque reservadas apenas para os ‘iluminados capas-pretas’ nos conselhos deliberativos (?), congressos ou fóruns mais fechados). Aliás há quem insista em atropelar e destruir o Conselho Deliberativo para substitui-lo pelos comandos, numa espécie de anarco-aparelhamento.

Mas a falta de discussão de fundo é por demais perigosa: pode transformar a categoria em tarefeira e massa de manobra. De fato, há muito não somos capazes de nos ouvir! Parece que estamos a crer, como fazem os teóricos pós-modernos neoliberais, que a razão é de fato a culpada por todos os problemas dos últimos dois ou três séculos. E que a massa deve ser alijada das discussões profundas. Seríamos nós educadores, estando cientes ou não disso, adeptos da Escola sociológica das Elites, cujos maiores representantes são os italianos Pareto e Mosca? Não é possível! Esses dois senhores representam o próprio fascismo na sociologia! Pareto chegou mesmo a se filiar ao partido fascista italiano!

Quantas vezes ouço dizer que a assembleia é soberana. Mas como é possível a assembleia ser de fato soberana sem fazer uma análise que leve todos os presentes a refletir a conjuntura (mundial, nacional e estadual) que vivemos? Como é possível ação revolucionária sem teoria revolucionária, sem análise? Há que fazer uma análise concreta de uma situação concreta. É preciso elevar a consciência popular, interligar o fato com a base e pela base.

Vale lembrar: a análise NÃO TEM QUE SER consensual! Na ciência, os consensos são mal vistos. Se o consenso analítico ou teórico fosse obrigatório não existiriam avanços científicos: Einstein jamais teria superado Newton! Marx não teria avançado em relação à dialética de Hegel! Nem os nossos alunos poderiam nos superar...  Quando muito eles estariam, como na escolástica medieval, ‘autorizados’ a se igualar a nós! Portanto, viva o NÂO CONSENSO inicial na análise! Mas, por outro lado, viva o CONSENSO nas bandeiras de luta! Precisamos de bandeiras que nos unam enquanto classe! É assim que sempre se uniu a classe trabalhadora na luta contra o nazi-fascismo colonialista, racista, machista, homofóbico e xenófobo!

E já que o tema é conjuntura política, vejamos.


Uma breve análise de conjuntura


A crise capitalista é mundial. Complicou muito desde o colapso de 2008-09, que levou importantes países do mundo a se desvincular umbilicalmente do mundo unipolar hegemonizado pelos Estados Unidos. Daí adveio importantes reações de sobrevivência e resgate de autonomia: G-77, NOAL, Mercosul, Pacto Andino, BRICS, UNASUL, CELAC, ASEAN, União Euroasiática, OCS. Uma série de fissuras e cisões foram abertas no interior da classe burguesa mundo afora. E isso é muito importante para a classe trabalhadora. E não deve ser ignorada por ninguém quem anseia por um mundo melhor.

Na sequência, tais iniciativas regionais independentistas começaram a incomodar o poder hegemônico unipolar que, desde 2011, vem dando respostas bem contundentes para se contrapor a essa tomada de consciência mundial. Em 2011, os Estados Unidos remodelam a ‘doutrina do choque’ na direção da chamada ‘guerra híbrida’ (revolução colorida com intervenção estrangeira). A doutrina do choque pensada por Milton Friedman e sua equipe, conhecida também pelo termo ‘capitalismo de desastre’, foi utilizada pela primeira vez no Chile, em 1973, para derrubar Allende, e na década de 80 por Thatcher na Inglaterra e Reagan nos Estados Unidos para impor o neoliberalismo acordado no Consenso de Washington. A doutrina, que visa quebrar a resistência sindical, partidária, governamental ou estatal da classe trabalhadora, foi utilizada também no desmonte do socialismo no Leste Europeu e na URSS, entre 1989-1991, após algumas poucas adequações.

A fim de criar uma situação de instabilidade favorável (uma nova crise do petróleo), os Estados Unidos, dominados pelas grandes corporações (Wall Street), financiaram as primaveras árabes, iniciadas em 2011 na Tunísia, e que entre outros governos derrubou Kaddafi na Líbia. Mas, com o tempo a estratégia foi se mostrando menos surpreendente e seus limites foram expostos na guerra da Síria, quando a Rússia (e mais Irã, China e Hezbolah) se viu na necessidade extrema de intervir no conflito, em meados do 2º semestre de 2015, a fim de evitar o cerco da OTAN.

Mas, a intervenção russa no conflito agora está bem próxima de seu fim. O exército sírio está bem perto de expulsar o Estado Islâmico de Raqqa (considerada capital dos terroristas). O exitoso apoio militar da Rússia à Síria contra o Estado Islâmico (criado pelos EUA e alimentado por Turquia, Arábia Saudita, Catar etc.) obrigou o poder hegemônico a mudar o foco do conflito novamente para a América Latina, já que a derrubada de Bashar Al Assad tornou-se de fato impossível.

Na América Latina, os governos progressistas cresceram muito após a tentativa frustrada de golpear a Venezuela Bolivariana em 2002. Contudo, dois ‘golpes suaves’ obtiveram sucesso na região: o que tirou Manuel Zelaya do poder em Honduras, em 2009, e o que derrubou Fernando Lugo no Paraguai, em 2011. De lá para cá, a direita vem ganhando bastante fôlego. Na Argentina, em 2015, foi de certo modo inesperada a derrota eleitoral de Cristina Fernández de Kirchner, peronista de boa cepa. Ao mesmo tempo, o imperialismo tenta passar obscuros tratados: TTIP, TTP e TISA, que visam anular os Estados e seus governos eleitos. Há tempos que nossos inimigos deixaram de ser os governos, mas muitos ainda não se aperceberam disso! Nosso inimigo são as grandes corporações, cada vez mais.

E no Brasil?

No Brasil, as jornadas de junho de 2013 funcionaram como uma espécie de primavera, ao levar milhões de brasileiros às ruas em protestos contra aumentos de passagem que culminaram no movimento ‘Não vai ter Copa’. As jornadas de 2013, embora carregassem muitas bandeiras populares legítimas, tiveram sem dúvida alguma a presença de financiamentos exógenos e de organizações de verniz claramente direitista (MBL, Vem pra Rua, Revoltados Online, entre outros). Esses setores da direita pediam (ou mesmo exigiam) durante os protestos que os partidos e movimentos de esquerda baixassem suas bandeiras vermelhas. As jornadas foram canalizadas para uma reação anti-PT que já vinha sendo preparada pela mídia há algum tempo, pelo menos desde o dito ‘mensalão do PT’, que levou José Dirceu à prisão (enquanto o criador do mensalão, FHC, continua impune).

Mas, a culminância deste processo, insuflado pela Operação Lava Jato (claro que em conluio com a mídia das 6 famílias), é o golpe parlamentar de 2016. É possível ver a presença da NSA (Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos) no período que antecede o golpe. Sem as escutas telefônicas do primeiro e segundo escalão do governo e da Petrobras, a Lava Jato não existiria.  Edward Snowden, ex-agente da CIA e da NSA, já havia avisado sobre essas escutas. Mas... O certo é que a Lava Jato foi criando um ambiente de pânico no Poder Legislativo (Câmara e Senado) e na Estatal de petróleo, sempre a partir do uso dos lobistas e das empresas terceirizadas que protagonizaram as delações premiadas.

A situação agora é crítica. Depois de autorizado pela Câmara e pelo Senado o ‘impeachment’ iniciou o seu processo. Contudo, uma resistência popular forte e diária está em andamento em todo o país e também no mundo. Até agora praticamente nenhum país, exceção da Argentina ultraneoliberal de Macri (até o EUA tem disfarçado bem), reconheceram o governo interino de Temer. São ocupações, passeatas, atos e manifestos que se repetem na denúncia de que o golpe é golpe. Ao mesmo tempo começam a aparecer evidências cada vez maiores da ilegalidade de todo esse processo, com as escutas telefônicas envolvendo Sérgio Machado (Transpetro) e Romero Jucá (ministro interino do Planejamento – que já caiu), SM e Renan Calheiros (presidente do Senado), SM e José Sarney e SM e o ministro da Transparência Fabiano Silveira (que pediu demissão na sequência). Enquanto isso, o calendário do impeachment fixado pelo Senado datou para 2 de agosto próximo o julgamento final.

Fora isso, o golpe mostra a que veio. Em menos de duas semanas, o governo interino e ilegítimo de Michel Temer já anunciou uma série de medidas extremamente antipopulares e elitistas: fechamento por vingança do ministério da Cultura – reaberto depois da incrível reação dos artistas, rebaixamento do ministério das minorias para a condição de secretaria, interferências da Igreja em assuntos de interesse público (Educação, Cultura, Saúde, Ciência e Tecnologia), anúncio da abertura do pré-sal, anúncios que apontam para privatizações de dezenas ou centenas de estatais, retrocessos na aposentadoria, desvinculação de percentual mínimo para Educação e Saúde, cortes no Bolsa Família e no Minha Casa Minha Vida, censura, demissões, e intromissão ilegal na EBC (TV Brasil) e revisão da meta de 2016 pelo Plano Temer, prevendo um déficit aumentado de R$ 170,5 bilhões, colocação em cargos essenciais de investigados pela Lava Jato, aquisição de velharias como o lema 'ordem e progresso', com a mancha da época da ditadura (com 21 estrelas representando os 21 entes federativos), supostamente escolhido pelo 'grande historiador' de 7 anos de idade Michelzinho etc., Temer falou ontem (01/06/16) ao país com a bandeira brasileira de 1889 (dos militares positivistas que fundaram a República - será que foi escolha do Michelzinho?)... Para tanto retrocesso há de se esperar muita 'desordem' (povo na rua)!

Não é por acaso que o governo golpista afirma que a situação econômica é muito pior do que se imaginava. Isso é uma narrativa para tentar justificar a sangria que se quer impor aos mais pobres e à classe média ‘coxinha’, que depois de virar ‘trouxinha’, transformou-se agora em um tremendo ‘escondidinho’.

Mas, o que falta para unir a classe trabalhadora? Uma boa dose de autocrítica e menos visão eleitoreira. Por exemplo, é extremamente desagradável ver o ‘Fora Todos’ de certos setores de esquerda virar ‘Fora ninguém’. Levando a análise por este caminho eleitoreiro, se o ‘Fora Dilma!’ NÃO nos unia, é óbvio que agora o ‘Fora Temer!’ nos une. A menos que se faça uma pirraça eleitoral vingativa, bem aos moldes de Eduardo Cunha.

Eis então algumas bandeiras que considero capazes de nos unir e de animar o povo para a luta ao mesmo tempo politizando-o:

  • Abaixo o neoliberalismo!
  • Fora o plano de metas neoliberal!
  • Abaixo os tratados neoliberais e obscuros: TTIP, TTP e TISA!
  • Fim do FMI e do Banco Mundial!
  • Auditoria da dívida pública já!
  • Pelo fim da interferência das empresas privadas nas escolas!
  • Abaixo a terceirização!
  • Fora as grandes corporações das escolas!
  • Não à privatização do ensino!
  • Privatizar a educação é eliminar um direito social e constitucional!
  • Abaixo o nazi-fascismo!
  • Fora com o projeto partidário e direitista ‘Escola sem partido’, ‘Escola sem ideologia’.
  • Abaixo a ditadura mundial do capital!
  • Lutar sempre! Temer nunca!

Renato Fialho Jr.