Artigo nº 004 - teórico

Sociologia: Uma ciência dividida


A sociologia surgiu dividida como ciência. Diante da Revolução Industrial e da Revolução Francesa, que estão intimamente ligadas ao processo de dissolução final do modo de produção feudal e o surgimento do modo de produção capitalista, afloram e explodem, pela primeira vez e de forma significativa, uma série de problemas sociais. Isto instigou os ativistas políticos (conservadores, liberais, socialistas...) e os filósofos da época a se debruçarem sobre a temática social. De uma hora para outra, devido aos enclousures - fechamento dos campos e expulsão do homem do campo para os burgos (pequenas cidades artesanais que nasciam) - as cidades incharam. Decorrentes desse processo e da incapacidade das manufaturas em absorver toda essa mão-de-obra, viu-se o primeiro grande problema social: o desemprego. A partir daquele instante o "trabalhador livre" (livre da servidão e da terra) poderia "escolher" o seu patrão.
Só que junto ao desemprego surge os demais problemas sociais: mendicância, roubos, assaltos, prostituição, moradia precária, valas-negras, epidemias etc.
A partir da necessidade de compreender o porquê de tudo isso, vão surgir vários esforços mais sistematizados de construção da ciência sociológica. O primeiro a utilizar o termo sociologia foi o filósofo Augusto Comte, por volta de 1830, mas não sem antes chamá-la de "Física Social". Comte pregava que, na ausência de uma metodologia própria para o estudo da sociedade, se utilizasse a metodologia estabelecida pela Física. Assim, separa o estudo da sociedade como faz a física: em Estática (estudo da ordem social) e Dinâmica (estudo do progresso econômico). Comte é o pai do positivismo, cujo lema é "O amor por princípio, a ordem por meio e o progresso por fim". Na bandeira brasileira, o lema aparece em sua forma sintética: "Ordem e progresso".
Outra tentativa foi elaborada pelo também positivista e discípulo de Comte: Emile Durkheim. Durkheim, usando o mesmo estilo, adotou a metodologia própria das ciências biológicas na tentativa de compreender os problemas sociais e não é por acaso que compreende o fato social (objeto da sociologia) como "coisa". Para ser fato social o objeto estudado havia de ser geral, externo e coercitivo. Para ele, a sociedade equivale a um determinado ser vivo, portanto ela seria dotada de cabeça (o Estado), corpo e membros, com vários órgãos e cada órgão, com uma determinada função, gerando uma interdependência ou dependência mútua. Daí é que Durkheim tira a idéia de solidariedade mecânica (coesão social própria das sociedades menos complexas) e solidariedade orgânica (coesão social própria das sociedades mais complexas, ou seja, o capitalismo, considerado por ele a sociedade mais perfeita).
A escola positivista será acusada de a-histórica, ao se concentrar na manutenção da ordem e no desenvolvimento de uma razão meramente técnica e capitalista, como se o capitalismo fosse eterno (para sempre).
Mas, como afirmei anteriormente, a sociologia nasceu dividida. Se de um lado vemos surgir o positivismo burguês (que se contrapõs em vários aspectos ao legado iluminista), do outro, seguindo a linha revolucionária das Luzes, nasce a concepção social, econômica, política, filosófica e histórica de Karl Marx e Friedrich Engels: o chamado Socialismo Científico (o que poderíamos chamar de "sociologia" marxista, embora sobre o perigo de reduzir sua abordagem muito mais ampla).
A teoria desenvolvida por Marx fundamenta-se na aplicação do método dialético, retomado e desenvolvido por Hegel, com o fim de desvendar a sociedade capitalista, entendida como um determinado modo de produção condicionado historicamente. Marx, sim, buscou desenvolver uma metodologia própria ao estudo da sociedade, pois as relações sociais jamais poderiam ser compreendidas como se fossem átomos, fenômenos físicos ou estruturas orgânicas biológicas. Marx verá na luta de classes o motor que faz movimentar a história e transformar as relações sociais, a natureza e as próprias sociedades ao longo dos tempos. Compreende também que o capitalismo, por tornar-se cada vez mais uma força social (onde mais e mais trabalhadores cooperam para a produção do mundo social), terminaria por ceder lugar ao socialismo, mas não sem a ação decisiva, determinada e consciente da principal e mais numerosa classe social da contemporaneidade: o proletariado, que ele, sabiamente, chamou de "coveiro do capitalismo".

Renato Fialho Jr.